

As artes da cena disso se fazem. Da proximidade. A experiência se dá ali, frente a frente. E por isso, ter participado do processo de criação de Um corpo bem de perto lá em 2006, foi um privilégio, incorporado em mim. Uma parceria que se nutre frequentemente ao longo do tempo nessa aproximação recorrente com a bailarina e coreógrafa Luciana Paludo, feita de afinidades, silêncios e entendimentos.
No processo que originou a obra Um corpo bem de perto, pude acompanhar a elaboração de um repertório de questões pessoais da intérprete/criadora que vinham à tona, conduzidos pela mão madura e insatisfeita da Lu, sempre querendo mais e questionando os caminhos de sua obra. Uma obra que se configurou em fragmentos que iam se sucedendo, mas deixando vestígios em cena, como as experiências dançantes que revelam suas marcas no corpo da bailarina. Vestígios e apagamentos contidos no proprio ato de dança que permanece enquanto se desfaz.
E que corpo é esse que nos desafia? Um corpo que transita entre o vigor técnico e seu despojamento habitual. É do humano que se faz tanta potência e que se faz incrível, não pra se sobrepor, e sim pra nos fazer acreditar que somos feito da mesma matéria e sonhos. Luciana nos convida a um exercício poético de acolhimento, uma visita a sua intimidade partilhada, por caminhos cheios de beleza, poesia, encantamento, mas também de incertezas, angústias, finitudes, precariedades. Basta querer acompanhá-la. Basta se dispor a estar com.
Esse corpo tece seus discursos com outra ordem da linguagem. Não precisa se explicar. Tem uma fala límpida, cristalina, mesmo quando sugere que nos percamos, pois não quer definir o percurso, mas abrir caminhos. Então, Um corpo bem de perto se faz carne-pensamento, palavras-movimento, asas-escápulas. A gente enraíza e voa ao mesmo tempo. A respiração, o rumor dos passos, a água que escorre, um músculo, uma cavidade, o osso, a pele, o olhar.
O trabalho foi criado dentro do projeto Casa Bild, que propunha um espaço para o desenvolvimento de linguagens autorais em dança, estreou em 2006 no Teatro de Arena; nesse ano recebeu prêmio Açorianos de Dança de melhor bailarina, coreografia e trilha sonora. Em 2007 realizou turnê nacional, através do Prêmio Caravana Funarte de Circulação Nacional – Dança. E agora retorna pra onde tudo começou.
Pra estar ali, com esse corpo bem pertinho, é só ir ao Teatro de Arena, nos dias 22, 23 e 24 de novembro às 20h. E que presente poder ver depois de mais de uma década esse corpo em cena, esse corpo que é o mesmo, mas que se faz outro, porque se faz do tempo que carrega. Mais uma oportunidade de ver a Lu se fazer dança, se desfazer no espaço e persistir em nós, afetados e nunca mais os mesmos.