
“Ecos” é uma releitura da obra homônima que foi apresentada pela Transforma Cia de Dança em 1993 e que volta aos palcos para comemorar a trajetória de 35 anos do grupo. Uma história marcada pela valorização da linguagem do jazzdance na capital gaúcha, formando gerações de excelentes bailarinos e bailarinas como Peter Lavratti, Marcela Reichelt, Jenifer Guedes, Paulo Guimarães, Aldo Gonçalves, Pamela Agostini e Mauricio Miranda, entre outros. Por isso, foi bastante empolgante ver a manutenção desse núcleo artístico que revisita seu repertório com um elenco afinado e que celebra em grande estilo esse feito de seguir produzindo e consolidando sua estética singular.
Para 2022 a obra escolhida, Ecos, mostra-se ainda atual, infelizmente, com a situação das ameaças ao meio ambiente em escala cada vez mais preocupantes. Suzana d’Ávila é a diretora e fundadora do grupo e divide a coreografia com Pamela Agostini. A direção artística é de Dante Saldanha e Fernando Muniz. A escolha acertada dos criadores é de vermos essa natureza ecoando nos corpos que dançam e o risco de tudo se dissipar e ser exterminado.
As coreografias da nova versão são o ponto alto da montagem e revela um elenco harmônico e com espaço para evidenciar suas potencialidades técnicas/expressivas. A tradição da jazzdance que marca a trajetória da Transforma é um patrimônio que Suzana mantém e que recupera em atmosferas que em vários momentos parecem fazer também um tributo aos grandes nomes do jazz nacional como Roseli Rodrigues e Erika Novachi, mas traduzindo isso com sua identidade própria. E é na partilha com Pamela Agostini que essa renovação se consolida e ganha relevo especial. Pamela tem uma consistente trajetória na Cia Municipal de Dança e carrega uma experiência contemporânea de dança que encontra espaço e corpo para nos presentearem com sequencias cativantes e bem estruturadas coreograficamente. E Suzana é generosa e abre esse espaço e trafega também por essas proposições. O resultado tem o embalo, o tempero e o molho do jazz e ao mesmo tempo uma poética delicada e ao mesmo tempo política que se complementam.
A iluminação de Karrah envolve as cenas com requinte e criatividade, emoldurando e dando contorno às movimentações e arranjos corporais e a trilha sonora selecionada cadencia o ritmo do espetáculo que nos leva junto. Há de se destacar a presença quase mítica de Pamela Agostini na abertura e encerramento como uma deusa mãe natureza e nas soluções cenográficas com tecidos esvoaçantes e translúcidos e cordas que remetem a ramos vegetais que criam tramas entre os corpos dos bailarinos e baialrinas. Os arranjos dançantes resolvem a dramaturgia de um modo simples, o que não é fácil e se unem à plasticidade bem resolvida dos elementos cênicos.
A natureza ecoa nas movimentações e nos corpos que vibram, deslizam, saltam, giram com segurança e impetuosidade como nos ritmos dos ecosssitemas que se organizam para funcionar assim organicamente. A dança fala por si, mesmo quando essa natureza é ameaçada pela mecanicidade dos corpos num mundo industrializado e tecnologizado. Ecos fala da natureza, fala de tudo que ecoa dos nossos atos de consumo e de descaso com o meio ambiente, fala dos ecos do jazz ainda vivos e pulsantes, fala da dança que se renova depois de meses da pandemia como a flora e a fauna depois de uma devastadora queimada. E fala até dispensando as palavras que aparecem, pois, esse discurso todo está em cada gesto, em cada movimento dançado. A Cia Transforma se transforma sem negar nem deixar de valorizar suas raízes. Acabamos diante de um espetáculo de dança bem dançado, e por isso bem pensado e resolvido. Ecos é uma montagem que flui porque se reconhece e se permite e isso é tão bom para o espectador.
Direção geral: Suzana d’Avila
Assistência de direção: Karina d’Avila
Coreografia: Suzana d’Avila e Pamela Agostini
Direção artística e roteiro: Dante Saldanha e Fernando Muniz
Elenco: Aléxia Souza, Alina Carvalho, Andrei Martins, Bruno Manganelli, Daniela Muttoni, Dante Saldanha, Denise Almeida, Fernando Muniz, Laura Mello, Luíse Robaski, Paula Molina e Thiago Diehl.
Participação especial: Pamela Agostini
Bailarinos convidados: Beatriz Collares, Bruna Mattos, João Alves, Manoela Figueiredo, Matheus Saraiva, Regina C Tanski, Renata Pegorini e Vitória Prusch.
Produção: Dante Saldanha, Fernando Muniz e Karina d’Avila
Concepção de iluminação: Karrah
Operação de iluminação: Mauricio Rosa
Figurinos: Ballare e Zerley Araújo
Adereço cênico: Gustavo Dienstmann, Dante Kepler e Denise Almeida
Coordenação de divulgação: Daniela Muttoni e Fernando Muniz
Arte gráfica: Daniela Muttoni
Textos: Karina d’Avila e Aléxia Souza
Fotografia de cena: Alexei Willy