Cinema na beira: outros circuitos de produção e exibição no litoral norte do Rs

A sessão do filme Duas cruzes realizada na quinta-feira dia 16 dentro do projeto “Cine Bah!obah – Cinema ao ar livre”, em Imbé, foi mais do que uma atração em meio à programação de folia do carnaval que se aproximava. Foi uma singular e relevante experiência para as dezenas de espectadores que acompanharam a exibição sobre o céu estrelado e o ruído do mar ali bem perto. Estávamos diante de uma obra que não se encaixava talvez nos padrões e normas da dita produção profissional nacional ou hollywoodiana, mas estávamos diante de uma obra que se reveste de uma narrativa autêntica e genuína, por isso, envolvente na sua simplicidade e capacidade de comunicação. Então começo com alguns apontamentos que fizeram tão especial esta vivência.


1) a escolha do filme apresentado foi o primeiro grande acerto. Uma obra produzida por uma cineasta mulher praieira que assina tanto o roteiro quanto à direção do curta metragem Duas Cruzes.


2) a produção do filme é uma das raras produções comunitárias, envolvendo moradores da praia de Cidreira no seu fazer como atores, técnicos e produtores.


3) a obra recupera a identidade litorânea e a inspiradora tradição oral das histórias contadas à beira mar.


4) a sessão acontecia ao ar livre em uma grande tela propiciando a experiência coletiva de ver cinema num município em que não há salas de exibição nem de teatro.


5) a sessão era gratuita e contava com a participação da sua criadora em um fraterno bate-papo com o público partilhando detalhes da sua feitura.


Terminei a sessão pensando em várias questões estéticas e éticas com as quais ainda precisamos lidar.
A primeira delas é o desafio de estabelecer um circuito onde essas obras consigam espaço para serem vistas. Não basta estarem disponíveis nas redes. O depoimento de vários espectadores deixou isso claro, no desconhecimento de uma obra produzida há mais de uma década. E isso que eram espectadores interessados nas coisas do litoral, mas com dificuldade de encontrar essa produção na profusão de material disponível na internet.


Também fiquei pensando e refletindo sobre esse modo de fazer uma produção que tem na sua possível fragilidade o seu grande trunfo e potencial. Talvez não tenhamos ali os melhores atores dirigidos pelos grandes nomes que padronizam as interpretações das produções feitas no nosso país. Talvez não tenhamos ali a perfeição dos maneirismos estéticos dos movimentos de câmaras, enquadramentos e uma direção de fotografia de iluminação cuidadosa copiando diretores premiados e nem um desenho de som hi-tech impecável.
Fiquei refletindo o quanto todo esses padrões não garantem um real interesse e muitas vezes acabam inclusive deixam de lado uma história bem contada e um material humano que realmente possa aparecer na tela e ganhar uma trilha sonora caprichada feita por artistas desse litoral.


Por isso, o grande mérito do espaço Bah!obah Arte e Cultura de estar investindo em estabelecer este circuito de exibição sem cair na fácil opção por filmes comerciais e de sucesso garantido com altos custos de liberação de direitos.


Foi uma noite do público poder ver aquele litoral onde moram. Ou de encontrarem aquele litoral que visitam constantemente como veranistas e que os faz voltar ou lá querer morar. Um litoral que pouco ou nunca aparece no cinema que temos acesso.


O Cine Bah!obah com curadoria de Marcelo Cabrera que produziu o evento com Juliana Ludwig vem cumprindo uma importante e relevante ação cultural independente e sem qualquer apoio público. Já exibiu o documentário Um mar de danças, do Núcleo Imagem e Dança de Imbé e o documentário do projeto Botos da Barra, com a participação do coordenador Ignácio Moreno e pescadores locais.
Assim, num trabalho de persistência, coragem e resistência esse circuito vai se afirmando e possibilitando que um outro imaginário possa também fazer parte do circuito de audiovisual gaúcho.

Bravo! Bravo!

DUAS CRUZES

Ficha Técnica

Roteiro e direção: Lizzi Barbosa
Produção: Lizzi Barbosa e Casa da Cultura do Litoral
Imagens e Edição: Ivan Therra
Som: Ivan Therra e Lutiano Weiss
Trilha sonora original: Ivan Therra, Adriano Sperandir e Cristian Sperandir

Elenco: Fabiola Luz, Luli Luz, Brigit Speggiorin, Oscar Lima, Henrique Soares, Jasmine Vasconcelos, Eduardo Gonçalves e Gustavo Webber, Fabiola Luz, Luli Luz, Edinho Calderon, Pedro Carvalho, Natália Wingert, Oscar Lima, Brigit Speggiorin, Henrique Soares, Omar Luz, Artur Lencine, Denise Oliveira, Gí Maíba, Diego do Pandeiro, Denílson Ferreira, Denílson Silva, Bruno da Fortaleza, Ricardo Lobão, Majú de Paula, Jucilara Kegler, Jasmine Vasconcelos, Educardo Gonçalves, Gustavo Webber, Gabriel Gonçalves, Marina Luz, Júlia Luz, Nanhane Ferreira, Aninha Nicolau e Denise Silva

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