Em 1996 decidi fazer uma loucura. Lançar um jornal exclusivo de dança e independente aqui no Rio Grande do Sul. Sim, há quase 25 anos, era uma época que o celular recém se espalhava e a internet era uma coisa de poucos e bastante limitada no seu alcance e recursos. Assim nascia o DANÇARTE num formato de revista de bordo da época, compridinho e fininho, com 12 páginas, mas cheio de espaço para artigos, críticas, resenhas, opiniões, a programação e história da dança no geral, das escolas e profissionais de dança locais.
E como tornar viável? Vendendo assinaturas e anúncios. E assim nos aventuramos. Em uma época que tinha que se digitar as matérias, editar os textos e fotos, montar o boneco de cada pagina, diagramar as páginas, fazer fotolito, imprimir, etiquetar e postar cada exemplar, além de distribuir em pontos de cultura parceiros. E foi um bocado de gente que abraçou a ideia, seja na feitura quase artesanal, na revisão, na produção dos textos e como assinantes, que ultrapassaram os 300 espalhados por 17 cidades do RS e alguns de fora do Estado inclusive. Para as cifras da internet de hoje pode parecer nada, mas foi uma forma de estarmos trocando informações, fazendo a produção de dança gerar reflexão, conectarmos e falarmos do que a imprensa local praticamente não dava espaço e atenção.
Tinha espaço para o que estava em cartaz, para os eventos (e eram um bocado do ConeSul, o Unidança (da UFRGS), o Encontro Latino-Americano de Dança de Passo Fundo, o Santa Maria Em Dança, o Dançando NH, a Noite do Folclore (Canoas) o Bento em Dança, além dos nacionais como Confort em Dança, Festival Internacional de Dança Bahia Seminário Nacional de Dança de Brasília, ). Tinha história da dança, tinha crítica, tinha entrevista, tinha aviso de audições, informativo de cursos e oficinas. Tinha o perfila das escolas de Balé como Balé Concerto, Gutierres, Ballet Redenção, tinha jazz do Transforma e flamenco do Tablado Andaluz. Tinha espaço para articulação política como da constituição da Comissão Gaúcha de Dança que teve um importante papel naquele momento, inclusive de encaminhamento de propostas para a área ao candidatos ao governo.
Foi assim que pude entrevistar a grande mestra Dona Tony Petzhold com seis décadas atuação cheia de histórias e a jovem Carla Korbes, com 16 anos, partindo para os Estados Unidos onde foi solista do NYC Ballet e primeira bailarina do Pacific Northwest Ballet, em Seattle. E elaborar matérias de lavar a alma com Dagmar Dornelles e Newton Moraes; os 10 anos do Terpsí; os 38 anos do Ballet Lenita Ruschel; a inauguração de espaços inovadores como do Engenho da Dança, da Jussara Miranda e do Buraco, da Andrea Druck; da continuidade do inestimável Dança Criança, da Leta Etges. E ao mesmo tempo todo interesse na nova cena que surgia com criadores, como a I Mostra de Coreógrafos Contemporâneos de POA em maio de 1998.
E ainda colaborações sempre determinantes: Monica Dantas (trazendo na concorrida coluna Hora H preciosas informações históricas de Merce Cunningham a Mary Wiggman, do Balé Romântico a Balanchine, de Martha Graham a João Luiz Rolla), Cibele Sastre (Só podia ser dança), Claudio Etges, Eva Schul (Grupo Corpo: Baião internacional), Andrea Druck (O pau(-brasil) do Edison me diverte mais que o bimbo do Clinton), Ana Goulart (Retina: dança e vídeo), Tatiana da Rosa (Para desfazer alguns nós) Cássia Navas (Festivais) e Cintia Kunifas (Universidade: Criatividade x academicismo?).
O lançamento foi no saudoso Restaurante Birra & Pasta, tendo a empresária Eleonora Rizzo como nossa apoiadora, com um charmoso coquetel que teve a presença de importantes nomes da dança como Taís Virmond, Vera Bublitz, Ângela Spiazzi, Cadica Borghetti, Ivan Motta, June Machado. E uma performance baseada na ideia de clonagem (era época da ovelha Dolly) e assim tínhamos clones dançantes de Isadora Duncan, Pina Bausch, Martha Graham, Margot Fontain, Rudolf Nureyev, numa animada e irreverente coreografia com participação de Monica Dantas, Thais Petzhold, Dani Boff, Alexson Wentz, Dani Aldabe, Mariana Moojen, Leticia Marques e Flavia Pessato.
Foram dois anos de muito trabalho, de abril de 1996 a agosto de 1998, 11 edições. Por um tempo as assinaturas conseguiram manter os custos de produção do Dançarte, mas logo passou a não ser suficiente pois tínhamos de abrir mão de outras atividades pra trabalhar de graça, e as edições foram se esperando. Mas foi um período que creio que o Dançarte deu sua contribuição e colaborou na formação em tempos que não se tinham site, nem blogs, nem espaço na televisão e jornais. Uma ação recheada de um bocado de idealismo que nunca abandonamos e essa energia foi canalizada a novos desafios que surgiam na cena da dança gaúcha. Gratidão a todxs que assinaram e o ajudaram a manter, a todxs que leram e dançaram por suas páginas.
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Que legal Airton! Parabéns por estar sempre inventando, promovendo e divulgando a dança local e de outros lugares, muito compartilhamento!!! Tenho um número comigo de lembrança ❤
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